domingo, 25 de março de 2012

Quando a voz do futebol inglês se calou



O futebol é um trampolim para a imortalidade. Os jogadores atingem a fama eterna por meio da habilidade, enquanto os técnicos se valem de sabedoria e argúcia. Já os narradores, mais raramente, entram para a história graças às suas palavras — ou à falta delas!
O radialista alemão Herbert Zimmermann foi protagonista de um eloquente silêncio na final da Copa do Mundo da FIFA Suíça 1954. Narrando para milhões de ouvintes da Alemanha Ocidental, ele ficou mudo durante incríveis oito segundos, quando Helmut Rahn marcou o gol do título sobre a poderosa Hungria nos minutos finais da partida. Isso logo após de proferir as palavras mais marcantes da história do radialismo esportivo, descrevendo o gol da virada.
Ao norueguês Bjorge Lillelien não faltaram palavras quando a seleção do seu país, então última colocada no Grupo 4 das eliminatórias europeias para a Espanha 1982, venceu a líder Inglaterra por 2 a 1. Eufórico, ele extravasou toda a sua felicidade na televisão norueguesa. "Lord Nelson! Lord Beaverbrook! Sir Winston Churchill! Sir Anthony Eden! Clement Attlee! Henry Cooper! Lady Di! Margaret Thatcher, você me ouve, Thatcher?! Seus garotos levaram uma surra daquelas! Seus garotos levaram uma surra daquelas!"
A provocação de Lillelien foi parodiada inúmeras vezes. Para os ingleses, contudo, a narração mais famosa foi a de Kenneth Wolstenholme, já nos instantes derradeiros da final da Copa do Mundo da FIFA Inglaterra 1966. Os donos da casa venciam o jogo por 3 a 2 até o último minuto da prorrogação. Um longo lançamento para Geoff Hurst foi a deixa para Wolstenholme pronunciar as palavras que o consagrariam para sempre na história do esporte.
"Algumas pessoas entraram em campo, elas acham que acabou", disse o narrador, enquanto Hurst penetrava na grande área da Alemanha Ocidental e erguia a canhota para desferir o chute. Quando a bola saiu dos pés do camisa 10 e morreu no fundo das redes de Hans Tilkowski, selando a vitória por 4 a 2, ele completou: "Agora acabou!"
As célebres palavras de Wolstenholme transcenderam o universo esportivo e entraram para o imaginário britânico. Elas batizaram um programa de televisão estrelado pelo ex-atacante Gary Lineker, viraram letra de música dos Beatles, título de álbum da banda The Dentists, campanha publicitária para ração de cachorro e para uma rede de lojas de departamento, além de terem inspirado as últimas frases de um livro de Terry Pratchett e um filme de terror.
Wolstenholme mal poderia imaginar a dimensão que as suas palavras tomariam. Nascido em 1920 na pequena cidade de Worsley, a oeste de Manchester, ele começou a frequentar os jogos do Bolton no Burnden Park quando tinha apenas quatro anos. Após ter sido condecorado por suas façanhas como piloto de bombardeiro na Segunda Guerra Mundial, Wolstenholme foi contratado pela BBC em 1948.
Até então, ele nunca havia assistido a um programa de televisão, muito menos narrado uma partida de futebol. Nada disso, porém, o impediu de se tornar a voz de 23 finais da Copa da Inglaterra e de cinco edições da Copa do Mundo da FIFA. Locutor e apresentador, o inglês foi um pioneiro da imprensa esportiva. Não à toa, a EA Sports decidiu utilizar a sua voz inconfundível nas partidas clássicas dos games da série FIFA.
"Ele tinha uma voz maravilhosa, da qual todos se lembram", disse Bobby Charlton a respeito de Wolstenholme. "Além disso, ninguém esquece aquelas famosas palavras. Ele criou uma imagem na cabeça das pessoas. Não foram apenas os jogadores que fizeram parte do título de 1966. Wolstenholme também fez."
Jimmy Hill, que trabalhou com o narrador nas cabines de transmissão e em mesas redondas, disse que "sentar ao lado dele era como sentar ao lado de Deus".
Há exatamente uma década, o grande Kenneth Wolstenholme faleceu aos 81 anos. As palavras dele e aquelas dos maiores locutores esportivos, no entanto, sempre serão eternas.
Créditos: FIFA.com  

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